SAUDAÇÕES A TODOS

DENTRO DO MEU RANCHINHO DE SAPÉ, SÓ HÁ DE ENTRAR OS GRANDES AMIGOS E SEMPRE HAVERÁ DE TER UM BOM CAFEZINHO E UM NACO DE BISCOITO DE POLVILHO. UMA CADEIRA COM ASSENTO DE TABÔA TRANÇADA, UMA MESA COM LASCAS DE JATOBÁ, UM BULE DE CAFÉ COM UM PAR DE XÍCARAS ESMALTADAS E UM BOM CASO PRÁ PROSEAR.





VEM PRA CÁ. SENTA COMIGO E VAMOS VIAJAR NO TEMPO...







sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A BOMBA DE 70

A nossa cachorrinha ficou proibida de entrar para dentro de casa. É uma norma que é obedecida quase sempre. A exceção é quando, que por motivo de jogos de futebol ou outro evento de comemoração, soltam fogos de artifício.
Dá muito dó de ver o desespero do animal a procurar um lugar seguro para se esconder. Ela enfrenta toda a autoridade da casa, invade a sala e o quarto para se enfiar debaixo da cama, e de lá só sai quando percebe que o perigo já passou. Ou então para buscar outro esconderijo. Aí sim, somente nesta condição fica liberada.
Eu não cachorro não, mas todas as vezes que escuto barulho de rojão fico também muito assustado. O meu coração acelera parecendo um martelo pneumático, daqueles que quebram os concretos por aí.
Lá em casa nunca entrou nenhum tipo de bomba ou rojão. Os meus filhos, quando eram pequenos, pediam pra comprar bombas e eu logo respondia:
- Se quiserem, eu compro traque, mais do que isso eu não compro,não.
O meu sogro compra pra soltar lá no sítio dele. Diz que é para espantar os bichos que rondam por lá e dão prejuízos: as lontras que roubam os peixes do açude, os gambás que mexem com as galinhas e outros animais silvestres noturnos que insistem em buscar alimentos nas criações do sítio.
Mas em tempos de comemoração ele também solta rojões. No dia de Nossa Senhora, 12 de outubro, ele sempre queima uma ou duas caixas de rojões de três tiros para comemorar. Se ele fica feliz por alguma vitória alcançada ele solta as bombas e grita viva.
Eu já fico longe destas atitudes. Sempre acho que vai acontecer uma tragédia. Igual àquela que aconteceu quando eu era menino com o Mané Vilela, um colega de escola e vizinho na minha cidade natal, no interior do estado de São Paulo.
Era mês de junho, naquela época ninguém tinha muito controle sobre as vendas de fogos de artifício como hoje. Qualquer um podia comprar bombinhas no armazém do Seu Osvaldo Calgari. Lá tinha desde traque até bomba de 100, que era aquelas de arrebentar latas de vinte litros com cinco tijolos em cima, um perigo. Os meninos pediam dinheiro pra mãe pra poder comprar balas e ia ajuntando até ter o bastante para compras as bombas.
Naquele dia o Mané Vilela, filho do Seu Miguel, que era nosso vizinho de sítio, tinha comprado algumas bombas. A gente estudava de manhã: entrava às sete horas e saía às onze, que era tempo de ir pra casa e ainda pegar no batente no período da tarde. O Mané fez muita propaganda das bombas que comprou, por isso a escola toda estava sabendo que ele iria fazer um barulho enorme com elas. Tinha uma bomba de 70 e outras tantas de 50, estava tudo preparado para soltar logo na saída do portão da escola.
Os alunos foram saindo e se aglomerando na rua, aguardando o show prometido. O Mané Vilela foi descendo a escada que dava acesso ao portão e verificou no embornal pendurado no pescoço se as bombas estavam lá. No bolso do calção, uma caixa de fósforos que trouxera de casa balançava no toque firme ao chão dos pés calçados com o “sete- vidas”, um calçado tradicional da época.

Mané Vilela parou no centro da aglomeração, enfiou a mão dentro do embornal e escolheu uma bomba de 50, puxou a caixa de fósforo do bolso e preparou para acender o estopim. Todos se afastaram para dar espaço para a explosão. O Pedro, filho do Tatinha, um menino da quarta série, trouxe uma lata de massa de tomate, que era para cobrir a bomba para que ela tivesse mais impacto.
- Sai de perto que eu vou soltar. – falou bem alto o Mané. – Saí todo mundo de perto. – repetiu.
Riscou a bomba na lateral da caixa de fósforo e jogou. A bomba caiu no chão e o Pedro saiu correndo em direção à ela e cobriu-a com a lata de massa de tomate, cobriu-a e voltou correndo.
- Bummm!. – a latinha subiu por mais de dez metros de altura e caiu despedaçada no chão. Todos aplaudiram.
- Agora eu vou soltar a de 70. – comunicou. – Sai todo mundo de perto.
Pegou a bomba, a caixa d fósforo e riscou. Quando ele jogou a bomba, pareceu que não tinha acendido o pavio. Esperou um pouco e nada aconteceu.
- Falhou. - disse . Caminhou correndo em direção à bomba para riscá-la novamente, apanhou- a pelo corpo de pólvora, posicionou para acendê-la, mas a bomba já estava acesa.
- Bumm!!
Uma grande explosão se ouviu, um grito de sangue e de dor marcou aquele momento. Dois dedos da mão direita do Mané Vilela foram decepados e um fluxo de sangue jorrou no chão. A sua barriga também ficou um pouco queimada, mas a camisa o protegeu.
- Socorro! Ajudem! - A pane foi geral. As crianças todas correram em direção às suas casas, assustados com aquela tragédia
Muitas pessoas adultas vieram correndo e levaram o Mané para a farmácia. Depois é que ficamos sabendo que o Mané perdeu também um pouco da visão por causa daquele acidente.
Todos foram para casa cabisbaixos. O resto do dia foi de tristeza. A história serviu de exemplo para os pais ficarem mais atentos com as crianças na hora de autorizarem o uso de fogos. A escola proibiu as crianças de soltarem bombas no portão da escola, mas na mão do Mané Vilela ficaram faltando dois dedos.
Depois daquela tragédia, eu nunca mais quis participar de nenhum evento que fossem usados fogos de artifício, não por medo, mas sim por respeito ao poder da pólvora, que é uma das substancias principais que se juntam para construir armas de destruição.


Paulo Freitas – Set/2010

2 comentários:

  1. Realmente com fogo nao se brinca, poder devastador, que usemos o lado da luz energia aquecimento equilibrado.ABs!

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  2. Que narrativa! Reportei-me aos tempos de criança! Aos tempos das 'peladas' da mangueira do bairro, aos sonhos infantís. Saudosismo gostoso...
    Parabéns! Grande abraço!!!

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